terça-feira, 17 de março de 2009

O Erê

Essa história começa nos confins da selva amazônica, lá de onde os xamans ficam confabulando lendas estranhas para vender revistas caras de página grossa dizendo que o povo indígena é muito exótico e natural. Lá vivia Erê.

Não aquele retardado mental que ficava querendo voar, sabe-se lá o porquê. Talvez efeito das guloseimas estranhas que só fazem aumentar a fama de que o povo indígena é muito ingênuo e natural.

Erê era esperto. Tanto, que aos doze anos já falava português, inglês e enganava a turma toda dizendo que aqueles homens que vinhas pegar plantas e animais da sagrada floresta eram divindades da seita tribal, que só queriam o bem do povo e que se levavam os papagaios, as araras, as onças, os jabutis e tudo o mais, era só para transformá-los em dinheiro. “Dinheiro, erê?” “É..., dinheiro, um tipo de mato esticado com uns desenhos e números que vai salvar a nossa tribo.” Erê era, na verdade, um visionário.

Mas Erê queria mais. Seu sonho era conhecer a selva de pedra, comer espetinho de gato e gastar um pouco de dinheiro naquelas casas de estripa(?).

Tanto que um dia, quando acertava o pagamento com os traficantes, ele não resistiu e pulou em um balaio grande que eles carregavam pelo mato adentro. Erê nem viu mais nada. Aquele balaio estava cheinhozinho de dardos tranqüilizantes.

Quando acordou “ele ficou bestificado com a cidade”, mas em vez de sair na rodoviária e ver as luzes de natal, ele tomou foi um cacete dos traficantes que depois lançaram-no em uma sarjeta onde encontrou vários como ele. Uns de pele morena, uns de pele bem mais escura, bem mais escura mesmo, mas todos já amigados pela condição em que viviam.

Logo, logo, Erê percebeu que seus amigos tinham atitudes pouco convencionais e que conversavam diferente com os outros e que de vez em quando mostravam umas barras de ferro e uns pedaços de ferro que faziam os outros correrem e que pipocavam quando os outros não entendiam (ou faziam que não entendiam) o que eles queriam. Erê percebeu também que havia outros que usavam roupas iguais e que também tinham aquele ferro que estourava e que esses que tinham roupas iguais eram todos de uma mesma tribo e que eles só estavam ali para pegar seus amigos e jogar num lugar parecido com o reino da fome, da sede, da violência e da desgraça total que o pajé ensinava na tribo que era o pior dos lugares.

Erê não queria se enturmar nos rituais da sua galera, mas ele logo entendeu que não teria outro modo. Foi na vez que ele cismou dizer ao homem de farda que queria entrar para a tribo dele e que não queria ficar correndo mais deles e aquelas coisas que o homem não entendeu direito. A resposta foi um outro cacete, mas dessa vez bem mais bem-dado, “Porque aqueles de uniforme, sim, eles sabiam bater”, que o deixou com uma raiva do cão.

Daí, Erê viu que sua tribo já estava formada fazia 500 anos e decidiu aprender a fazer o ferro pipocar também.

CONTINUA...

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